Eu, quando pequeno, fui matriculado em um colégio católico, que na época era muito grande, o prédio era enorme e com uma multidão de alunos, este colégio apesar do tamanho, nunca foi muito conhecido e não é até hoje.
Esse colégio tem relação com a primeira santa brasileira, que é italiana. (Pasme)
Eu fui criado e sustentado somente pela minha mãe, meu pai não estava presente, ele nos deixou, vinha de vez em quando, mas era ausente a maior parte do tempo.
Minha mãe sempre foi muito inteligente e trabalhadora, mas tudo ficou nas costas dela, inclusive minha avó que era muito doente, minha infância foi ir em hospitais e médicos, por conta da minha avó, no final ela faleceu e eu fiquei sozinho mesmo.
O resto da família é muito interesseira e sempre nos menosprezou, sempre quiz se intrometer sem ninguém ter pedido, sempre nos ridicularizou e diminuiu, mas para ajudar minha avó, ninguém nunca estendeu a mão, acho que por que não tinha homem em casa.
Eu era muito pressionado a ser comportado e educado, até demais, e sempre ouvia que tinha que ser grato, pela comida, pelo estudo e tudo mais, ouvi até demais, de muitas pessoas e acabei me sentindo culpado, desde muito cedo, e quando fazia algo, me sentia muito mal e ingrato.
Eu sempre ouvia de muitas pessoas que eu era afortunado, que muita gente queria estar em meu lugar, as vezes ouvi também que eu era Boyzinho e Mauricinho, não sei por que, eu nunca tive roupa de marca nem nada de mais, em casa era tudo austero, não tinha nem espaço para essas coisas, mas com o resto da família, sim, eles isso, mas eu não e isso nunca me importou, só a hipocrisia mesmo.
Nunca viajei com minha mãe, para lado algum, só ficávamos em casa, só o fiz depois dos 30 anos.
Ouvia essas besteiras até do meu pai que nunca arcou com nada, sempre me desmereceram, eu não sabia o que fazer ou o que pensar, me achava um lixo, quando fazia alguma coisa, que não era nada de mais, levava broncas enormes, me sentia a pior pessoa do mundo.
Eu só queria uma família normal, mas quando eu falava, já me cortavam, tipo deixa disso, não tem nada a ver, não é assim, você não sabe de nada.
Meu pai sempre falava, “conheço famílias que os pais brigam”, para você não é tão ruim, outras famílias também separam etc…
Ou seja, eu estava errado.
Mas tem famílias que não separam, famílias que o pai não é um merda e não abandona a família e as pessoas não são neuróticas, mas isso foi depois de grande que percebi.
Não sabia lidar com isso, era muito novo e fiquei retraído, quieto e envergonhado e nunca mais sai disso.
E o que o tal colégio tem a ver com isso?
Por ser católico e particular, todos pensam que era organizado, longe disso, era uma bagunça, não havia controle sobre os alunos, por conta do tamanho e do volume deles.
Havia muita violência, ou seja, bullying, que era generalizado.
No começo até que não, mas conforme foi passando o tempo, com cerca de 11, 12 anos, para frente, eu fui hostilizado, agredido física e verbalmente, rejeitado e humilhado, eu e muitos outros.
Eu nunca fui afeminado, nunca fui nada disso.
Mas eu era muito quieto, e fui gordo também, mas não tanto, não sabia jogar nada.
Sempre fui sozinho e na minha, não tenho irmãos nem nada.
As provocações não eram simples brincadeira, eram sistemáticas, roubavam nossas coisas, quebravam, jogavam no chão, quando não, nos ameaçavam, humilhavam, as vezes batiam e toda a classe vibrava com isso, tanto os meninos como as meninas instigavam.
Todo dia conforme chegávamos, éramos despejados em um pátio enorme, no térreo, onde ficava uma multidão de alunos, esperando um portão de ferro abrir, para a manada de alunos ir para as salas pelas escadas, um misto de estádio de futebol e prisão.
Um garoto todo dia era sistematicamente
agredido em frente ao portão, era jogado no chão, agredido física e verbalmente, na frente de uma multidão, parecia um filme de presídio.
Eu ficava distante, pois não queria ser o próximo.
Um dia esse garoto levou um chute no rosto, só lembro de ver ele correndo chorando e sangrando, eu lembro dele e do nome dele, tenho muita pena dele, lembro também do nome dos agressores, já identifiquei todos na internet, há muito tempo.
Os pais do menino agredido ameaçaram ir na delegacia de ensino, e deveriam mesmo, depois de algum tempo ele foi tirado da escola.
Não adiantava reclamar, os “responsáveis” dava uma bronca idiota tipo “respeite os colegas”, “isso é feio”, raramente acontecia algo com o marginal mirim, depois viravam as costas os moleques riam das irmãs e do “fiscais” e depois iam se vingar de quem reclamou.
Eu não aguentei muitas vezes e briguei muito, volte com olho roxo para casa e mandei muitos moleques machucados de volta para casa também, o que me salvou um pouco, foi que eu não era fraco, mas isso não adiantou muito.
Eu era novo e não sabia lidar com aquilo, em casa era forçado a ser comportado e fui jogado em uma Febem católica.
Naquele maldito lugar, havia comportamento de gangues, grupos de alunos que andavam e derrubavam quem ficasse na frente, jogavam no chão e pisavam no lanche dos outros, principalmente dos mais novos.
Em 1992, 1993, eu acho, na 6ª ou 7ª série, não lembro bem, uma menina que andava com a calça do uniforme socada, estava mexendo na lousa quando o professor não estava na sala,, de propósito, como sempre ela fazia, um aluno, um dos que agrediam os outros, aproximou-se e passou a mão na bunda dela, para delírio da classe, que urrava em êxtase, parece exagero meu? Lembro perfeitamente de tudo isso. A menina ficou constrangida? Não, olhou e sorriu. A classe vibrava, o sujeito virou herói e ganhou fama.
Eu não conseguia entender aquilo,, não cabia na minha cabeça, eu nunca faria aquilo, haviam me ensinado respeito em casa, ai de mim de pensar em fazer aquilo, e o que estava vendo não cabia na minha mente, e o idiota ainda vira herói, como os outros idiotas que viviam nos atormentando.
Esse era o colégio católico.
Lembro muito bem do nome e do sobrenome do aluno, hoje é supervisor em uma empresa de logística, ou algo assim e deve ser extremamente feliz e abençoado, um profissional exemplar não é mesmo.
Amaldiçoado sou eu.
Lembro que esse moleque usava um colar estranho com um pingente, usava tênis de marca, caro, tinha moral, confiança eu por outro lado tinha cabelo cortado curto tipo “reco”, gordinho, tudo simples, só tinha o meu medo, me sentia um lixo, cheio de receio de abrir a boca, de me mexer, não sabia o que fazer, ficava paralisado, me sentia no meio de uma jaula de animais.
Tinha um amigo meu, que eu achava que era meu amigo, que era muito hostilizado também, ele começou a me hostilizar, eu não gostava de estudar, achava tudo aquilo horrível, só queria que acabasse, e ele ia melhor que eu, então começou a jogar minas coisas no chão, me chamar de burro, eu não ando com burro, ele dizia. Ele olhava na minha cara, nos meus olhos e dizia que ele tinha orgulho de ser católico apostólico romano, não sei por que fazia isso.
Quando ele apanhava, pois era molóide, chorava como menina.
Também lembro dele, ele virou administrador, só que ficou gordo demais.
Um metido idiota, me arrependo muito de não ter quebrado dente por dente dele, eu podia fazer isso.
Mas me sentia um lixo, um capacho.
Os professores também humilharam, berravam e gritavam como animais, uma professora me empurrou na frente da classe toda.
Tinha uma professora que gritava como histérica, como eu tenho vontade de falar para ela hoje,” se a senhora não tem paciência, por que quer ser professora? Não tenho culpa dos seus problemas ou do seu salário baixo.”
Eles faziam chamada oral na frente da classe, de 30 ou 40 alunos e se você errasse ou gaguejasse, riam de você, todos os alunos.
Os professores não estavam nem aí, parece que gostavam.
Depois os alunos escreviam na sua carteira, “burro” e outras coisas.
Uma vez eu deixei de fazer uma lição, ou algo assim, não lembro o que foi, mas o professor de matemática ficou agressivo e começou a gritar coisas que eu não entendi o por que, “eu trabalho há 15 anos” , “pago minhas contas…”, ” tenho responsabilidade…” E ficava apontando para mim, não sei qual o problema dele, ele ficou tão agressivo que até os que estavam rindo de mim ficaram quietos.
Aquele dia eu queria morrer, mas já estava acostumado em ser rebaixado e pisado.
Hoje me dá raiva daquele anormal, queria encontrar ele na rua, o que eu fiz? Não fiz nada para ele. Eu nunca fui bagunceiro, pelo contrário.
As “irmãzinhas” tinham o péssimo hábito de entregar para os próprios alunos os boletos da escola, e quaisquer outras coisas que fossem endereçadas aos pais, por incrível que pareça, um dia resolveram cobrar eventuais medicamentos que você viesse a usar caso houvesse alguma eventualidade, tipo primeiros socorros.
Eu esqueci dentro do caderno. E então uma freirinha, veio na classe com alguns funcionários, me chamou, e me levaram em uma sala, ela “gentilmente” disse me olhando feio, “Seus país (ela não sabia que eu não tinha pai por perto?) não pagaram essa despesa, não é justo usar o que os outros pagaram.” Fiquei morrendo de medo, mas hoje deveria ter dito àquela gentil senhorita idosa: Desculpe, foi um lapso, caso eu sofra um acidente, não precisa me ceder nenhum medicamento comprado pelos pais dos pequenos marginais com os quais eu convivo todo dia, é só chamar a ambulância, depois pode me cobrar a ligação.
Inventaram de fazer campeonato entre as classes, e éramos obrigados a jogar, eu tive que ir mesmo sendo xingado por todos na classe.
Na hora do intervalo, naquela quadra imensa, parecendo a arena do gladiador, quem errava alguma coisa, fizesse um passe errado era vaiado e xingado pela multidão.
Eu fui vaiado, juntamente com muitos outros, o que foi meu consolo.
Só que um dia teve uma briga grande e feia, eu não estava nesse dia.
Teve menina grávida, teve outras coisas feias, eu não contei nem metade.
O pessoal fala da escola pública e deve ser ruim mesmo, mas se engana ao achar que colégio particular é diferente.
Eu carrego até hoje, o que eu vivi naqueles anos, não adianta falar que não é nada, que você supera, eu nunca consegui superar, as vezes esqueço, mas algumas coisas fazem tudo voltar a tona com um rojão.
Lembro das humilhações, quando abaixei a cabeça, tinha que ser “bonzinho”, não queria ser um peso em casa, para minha mãe, mais um.
Eu era “privilegiado” e ainda pisavam em mim, faziam minha cabeça de degrau, aqueles moleques medíocres,e eu era o bonzinho, o privilegiado.
Aqueles professores berrando e jogando nossos cadernos.
A humilhação das meninas, me chamaram de nojento, disseram que eu fedia, me empurravam no banco, ou sentavam longe de mim, sem motivo, pois eu nunca nem falei com elas, nunca fiz nada para ninguém.
E houve abuso de alunos, sim.
Um dia, outro aluno mais velho entrou no banheiro quando eu estava sozinho lá dentro, ele queria abusar de mim, não deixei, naquele momento alguma coisa tomou conta de mim, não sei o quê, criei coragem que nunca mais tive igual, olhei na cara daquele maldito e falei que não, ele disse que ia me bater eu falei que não importava, vamos ver quem bate mais. Eu pensei, se ele me bater eu corro, grito, ou enfio o dedo no olho dele, puxo o cabelo, enfio a unha na cara dele, chuto o saco, o joelho, não sei, alguma coisa eu ia fazer.
Ele desistiu, depois ficava me seguindo no intervalo eu ficava perto da cantina assim alguém podia ver tudo o que acontecia, ele disse que se eu contasse para alguém, eu ia ficar sem família, eu era criança, tinha 11, 12 anos, mas nunca fiquei com medo dele, nunca contei a ninguém, para que? Depois vi esse demônio mexendo com outros alunos.
Pelo menos disso Deus me livrou.
Isso é coisa que uma criança deva ver?
Deveríamos estar seguros naquele lugar, mas eu estava no meio do inferno.
Mas eu estava sozinho e sem ninguém para me defender.
Só aprendi que não tenho ninguém com quem contar, só posso confiar em mim mesmo.
Eu já tomei remédio, tive pesadelos, engordei muito, emagreci, fique doente, fiz duas faculdades, mas trabalho em um emprego de merda, sou sozinho, estou cansado.
Quando lembro desse último episódio, não consigo dormir, me dói as costas, minhas mãos tremem, como se um caminhão desgovernado tivesse passado há centímetros de mim.
Sinto calafrios, fico muito mal, dói o peito, a cabeça, as vezes não me reconheço.
Esse era o colégio católico, só tive paz quando sai, finalmente, com 15 ou 16 anos, não lembro, estudei o colegial em um colégio pequeno onde finalmente fui tratado com o mínimo de respeito.
Eu deixei de ir na igreja, minha família era católica, mas hoje é só da boca para fora, quero que está família que se dane.
Fui em umas igrejas protestantes, mas questionei algumas coisas que achei estranho e me chamaram de fariseu, então eu respondi: “se eu sou fariseu, vocês são idólatras…”
Hoje eu ouço e sigo os rabinos judeus, gosto muito dos seus ensinamentos e isso tem me ajudado e acalmado.
Eu fui perseguido como os judeus, por outros motivos claramente , talvez isso me faça sentido.
Eu me pergunto, onde está amor cristão? É isso que tem por trás dessas instituições religiosas?
Esses “católicos apostólicos romanos” são assim? Já provei da gentileza deles e foi bem amargo.
Já provei a gentileza de outros “cristãos” também.
Eu nunca mais ponho o pé naquele nem em nenhum outro colégio católico nem de outra religião.
Fui poupado do pior só para viver feito um exilado.
Hoje só acredito no Deus único, o eterno que me livrou, peço que me livre de novo, maior que ele não há.
Hoje treino na academia e quero fazer Krav Maga, se alguém tentar fazer mal para mim, vai pagar um preço amargo, o preço final.
Tenho mais de 40 anos mas hoje sou forte, quieto e ninguém ousa mexer comigo, os mais novos não tem a mesma força que eu, não sou mais o gordinho assustado.
Foi difícil e ainda é, sou muito sozinho, me falam para perdoar, superar, mas não é assim, eu recebi um monte de lixo, de entulho, e construí minha casa em cima disso, faz parte de mim, não consigo simplesmente esquecer.
Sou uma sombra, vivo pelas beiradas, não me aproximo muito e nem deixo que se aproximem de mim, não consigo, perdi muita coisa, minha vida escorreu como água pelo ralo,
Mas nunca prejudiquei ninguém, nem quero.
Perdoar, não sei, deixo para lá, por mim, mas não cruze meu caminho, não sei como vou reagir.
Peço desculpas pelo desabafo, minhas mãos tremem enquanto escrevo.
Eu não tenho com quem falar, por isso fica tão grande o relato, peço desculpas por isso.
Um servidor de apoio emocional e saúde mental. Desabafos anônimos, troca de experiências e apoio psicológico.
Pessoas depressivas, ansiosas, tdah, bipolares, borderline, autistas, dependentes químicas, anoréxicas, bulemicas, esquizofrênicas e afins.
É extremamente lamentável que eventos desse tipo tenham ocorrido, resumindo em um acúmulo de absurdos. Mas isso não me surpreende, levando em consideração o mundo do jeito que é, além do fato de que nosso país não é nenhuma referência positiva para o mundo em termos de aspectos como educação, respeito e dignidade. De qualquer forma, essa história relatada poderia virar um filme. Esses absurdos, incluindo certos aspectos religiosos controversos que dão nojo, deveriam ser bem escancarados.